Creio que
como todo mundo, ando pensando muito na situação política e econômica do nosso
país. Meu primeiro impulso foi abrir o Tarô
pra me ajudar a refletir. Porém, considerei o I Ching um oráculo mais apropriado ao tema. O milenar oráculo chinês,
analisado e comentado por Confúcio, sempre apresenta uma visão estratégica do
momento em que estamos vivendo.
Para quem
não conhece o I Ching, vou explicar
um pouquinho no que consiste. São 64 hexagramas (imagens de seis linhas, dois
trigramas) que abrangem todos os ciclos da vida. Se a situação é definitiva,
nos deparamos com um único hexagrama, coisa rara. Se está em transformação,
encontramos linhas em mutação que vão gerar um segundo hexagrama,
desenvolvimento do anterior.
Pois bem, encontrei
o hexagrama chamado Limitação e um segundo, Conflito. É, a coisa tá complicada.
O I Ching usa imagens da natureza e
costumes orientais muito antigos para evidenciar as situações. Muitas
expressões, se levadas ao pé da letra, não fariam o menor sentido para nós. Por
isso, vou usar minhas próprias palavras e as de Richard Wilhelm, autor do
clássico “I Ching - O Livro das Mutações”. Vale dizer que eu também já
escrevi um livro a respeito: “I Ching – Mensgens para o crescimento
pessoal”.
O hexagrama Limitação
fala, como o nome indica, das limitações que precisamos impor a nós mesmos e às
situações para que tudo funcione adequadamente. Limitações econômicas e morais.
As coisas não podem correr frouxas, mas também é preciso muito cuidado para não
apertar demais. O conselho geral do hexagrama é: “Sucesso. Não se deve perseverar ao se exercer uma limitação amarga.”
Acho que está bem claro, né?
Nossos
governantes, então, acertam quando impõem limites aos gastos públicos e punem a
corrupção. Porém, se exageram, o resultado é a revolta popular. Até as
limitações devem ter limites para serem aceitas sem maiores problemas. É mais
ou menos isso o que diz o hexagrama em seu julgamento.
Aí, vamos às
linhas móveis, em mutação: primeira, quarta e sexta, o que significa que logo
logo a situação pode mudar. Num primeiro momento, é preciso se conter sem
culpa. Se não dá para ir até onde gostaríamos, ok. Vamos até onde dá e
esperamos a hora certa de ir além. Mas é preciso ficar bem quietinho. Se não for
desse jeito, com certeza teremos problemas. Acho que já passamos dessa fase da
paciência, né?
Bom, vamos
para a segunda linha em mutação, a quarta linha, um segundo momento. Aí vem um
tempo onde a limitação é aceita porque sua necessidade é compreendida. Ou seja:
se a limitação visa o interesse comum as coisas vão bem; se não, temos
problemas. Quem acha que vivemos uma limitação necessária?
A terceira e
última linha móvel (a sexta do hexagrama Limitação) não é muito agradável. Ela
nos fala de limitações duras demais, que as pessoas não aguentam. Há muita
reação aos limites impostos. Ao mesmo tempo, a linha fala de limitações morais
que cada um deve impor a si mesmo para não se corromper. Soa familiar?
Incrível, né?
Onde é que
isso vai parar? O segundo hexagrama (resultado da mutação do primeiro) e
resposta à pergunta é: Conflito. O Julgamento deste
hexagrama diz: “Você é sincero e está
sendo impedido. Deter-se cautelosamente no meio do caminho traz boa fortuna. Ir
até o fim traz infortúnio. É favorável ver o grande homem. Não é favorável
atravessar a grande água.” Cada um deve fazer sua própria interpretação,
mas farei algumas considerações.
De cara,
pode-se entender que “de boas intenções o inferno está cheio”. Depois, é
inevitável nos lembrarmos do impeachment da Dilma e de pensarmos se Temer deve
renunciar. A qual deles o hexagrama se refere? Quem sabe, aos dois.
O hexagrama
confronta a esperteza e a força. Há um impasse. Somente uma pessoa com
autoridade moral, sabedoria política e digna de respeito pode tentar solucionar
o conflito buscando uma conciliação. Alguém imagina quem seria essa pessoa? Se
o conflito persiste a coisa fica mais feia ainda...
Tem mais:
“não é favorável atravessar a grande água”. Isso significa que não dá mesmo
para pensar grande, para mudar o país, para empreender tarefas difíceis e
grandiosas. Não dá pra sair da crise. Ao menos enquanto o conflito não for
solucionado. E podemos ir além: o país não conseguirá resgatar a credibilidade
internacional tão cedo. Triste, né?
O fato é que
insistir no conflito não leva a nada por mais que cada lado ache que tem razão.
Ânimos acirrados só resultam em caos. Esperteza e violência também não dão em
coisa boa. É preciso encontrar um meio-termo, por mais difícil que isso nos
pareça. Uma tentativa de prevenir o agravamento desse embate seria estabelecer
rápido regras bem claras e iguais para todos. Contudo, infelizmente não vejo
como isso é possível no Brasil de hoje, quando até a Justiça é claramente desigual
em relação a interesses poderosos. Só nos resta encontrar o tal “grande homem”
(ou mulher) capaz de resolver o conflito com uma decisão justa ou
conciliatória. Cadê?
Publicado no Clube do Tarô no dia 6 de março
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Por favor, nada de ofensas.